As matérias escolares que fazem parte da área de exatas passaram longe da escolha profissional de Débora Ely. Os números não faziam parte das paixões da repórter da Editoria de Notícias do Jornal Zero Hora; muito pelo contrário: desde criança, a leitura e a escrita foram suas principais companhias e mais tarde, ajudaram na decisão de cursar Jornalismo.
Antes de optar pela carreira de repórter, a porto-alegrense pensou em estudar Direito e seguir os passos dos primos e do irmão. Porém, a questão dos pisos salariais das duas profissões a fez mudar de ideia. “Eu comentava ‘não sei se eu vou cursar Jornalismo, porque dizem que pagam pouco’. Minha família me olhava e dizia que o Direito também não estava pagando bem”, lembra Débora, que escolheu “ganhar mal por ganhar mal” e fazer o que mais gostava: escrever histórias.
E foi no ano de 2008 que a “escolha super acertada” da jornalista teve início, na Faculdade de Comunicação Social (Famecos) da PUCRS. Durante os quatro anos de curso, a repórter aprendeu sobre as diferentes funções que teria chance de exercer e as áreas em que poderia atuar quando se formasse. Como destaque do período em que estudou na Famecos, a ex-aluna cita as aulas de redação de texto. “Foi a disciplina que mais acrescentou em toda minha formação acadêmica”, afirma.
Enquanto estava no quarto semestre, surgiu a oportunidade do primeiro estágio, que duraria em torno de oito meses: uma vaga na Assessoria de Imprensa do Ministério Público Estadual. Durante este período, Débora participou de uma seleção para estagiar na Rádio Gaúcha. Após alguns testes, foi aprovada e entrou para o Grupo RBS, lugar em que trabalha até hoje.
Questionada sobre a principal matéria produzida durante sua carreira, a repórter menciona o texto que foi publicado no jornal impresso e na edição on-line da Zero Hora sobre “casos de estupros investigados na capital gaúcha em 2015”. Antes da reportagem ser concluída, foram necessários dois meses de apuração e coleta de dados – um fato inédito para Débora. “Foi desafiador, pois eu nunca tinha ficado tanto tempo me dedicando a uma matéria só”, conta.
A origem dessa pauta foi a violência cometida contra uma menina de 16 anos no Rio de Janeiro (RJ) em maio deste ano. Na ocasião, um grupo de 33 homens dopou a jovem e abusou sexualmente dela. Os autores do crime também divulgaram vídeos do ato em uma rede social. “O caso ganhou uma repercussão gigantesca pela brutalidade envolvida e pela maneira que o estupro foi cometido”, ressalta.
Sensibilizada, a repórter propôs, durante uma reunião de pauta, uma investigação sobre os inquéritos concluídos pela Delegacia da Mulher em Porto Alegre no último ano. Segundo a jornalista, a ideia foi introduzida com uma pergunta: “Quantos casos a gente simplesmente não cobre, não noticia e ficam invisíveis na sociedade?”. Depois de obtida a aprovação para continuar o processo de produção da matéria, Débora iniciou as tentativas de acessar os documentos dessas situações. Entretanto, alguns obstáculos precisaram ser vencidos.
De acordo com a jornalista, uma das principais dificuldades enfrentadas na profissão, em especial na sua pauta sobre violência sexual, é o acesso àquilo que as pessoas não querem que seja dito ou divulgado. “Ninguém queria me deixar ver os inquéritos de estupro, porque todos esses processos tramitam em sigilo. Porém, depois de algumas negociações e de muita insistência, – fiquei umas duas ou três semanas só tentando conseguir esse material – deu certo”, diz.
O resultado da apuração foi surpreendente e deu título à reportagem. O texto Em 25 casos de estupros investigados, apenas um indiciado está preso pelo crime foi publicado no dia 6 de agosto e traz as histórias das vítimas, desde a violência sofrida ao processo judicial do agressor. “Foi a matéria mais extensa, mais profunda, que eu mais me envolvi. No final, eu já sabia ‘de cor’ o nome de todas as vítimas e o que aconteceu com cada um dos processos”, revela Débora.
Para a jornalista, o retorno dos leitores a respeito da sua publicação foi “muito interessante”, pois o momento em que a sociedade vive é marcado pelo empoderamento feminino e por bastantes reflexões acerca do tema, “por mais que ainda existam dificuldades”. Ela também defende a ideia de que os desafios impostos às mulheres são a colocação e o reconhecimento feminino, além do combate a cultura machista existente. “Tanto no Jornalismo, quanto no Direito e na Medicina, os desafios são os mesmos para elas”, conclui Débora.
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